Pausa na lamechice paea denunciar um velho hábito português... ou simplesmente Lisboeta, não sei dizer! E também não sei como ainda não fizeram um sketch sobre isto, porque eu esbarro neste tique a cada esquina que dobro... e de tão patético, dá-me vontade de rir!
Esta é uma tendência primavera-verão-outono-inverno muito em voga ali pelos lados do meu bairro, e de muitos mais bairros da nossa querida Lisboa... e desde criança que a ouço, principalmente no cabeleireiro, e penso na patetice que é adoptar uma tendência quando esta não nos favorece, só nos diminui aos olhos dos incrédulos e desconfortáveis clientes.
Estou a falar da mania irritante de estar a atender alguém e a comentar com o funcionário do lado as "vacas do dia" (tipo belle du jour, só que ao contrário, 'tão a ver?). Só isto já seria irritante, MAS o refinamento atinge proporções épicas quando o escárnio é arremessado em meias frases, palavras soltas e olhares de quinze minutos.
Exemplo:
- OLHA, (cabeça atirada na direcção da recepção, onde está "la vache du jour") tás a vê-la, não tás... depois conto-te....
(olhar estático de quinze minutos para o "kelega", lábio ligeiramente arrepenhado e sobrolho franzido, enquanto a cadeira vai subindo ao som de um nhéc nhéc nhéc)
(concentro-me na revista, mas os famosEs continuam os mesmos desde que nasci, e com a mesma postura: mal-vestidos e parasitários. Opto por gozar o quadro vivo, em vez do quadro Ana mais atrevida...btw, RIP para essa bela revista)
- Isto assim, filho, tá bonito... OH menina, quer escadeado?
(bolas, nem percebi que era para mim)
- AHMMM, Um bocadinho, em baixo, mas nada daqueles cortes à estrela da novela da TVI, se faz favor!
Diz o cabeleireiro do lado:
- Mas foi ela... ou àà'migaaaaa??? (olhar irónico, seguido de risada).... aiiiii filha, c'até a Varrac'aVana, como dizia o outroooo.
(mais um olhar de meia hora... começo a temer pelo meu cabelo)
-Oh Sandro, tu sabes perfeitament' c'uma anda a reboque da outraaa... é o padre e o sacristão...
-Aaiiii menina, isto tá mallll... sabe que eu sofro de "retmísia", não posso ver certas coisas, não é Antónioo?
Risada dupla e olhar intimidatório para a "vache qui rit".
(Pera, que o início da frase era para mim outra vez. Opto por um diplomático sorriso amarelo, para não atirar achas para a fogueira do Parque-Mayer-meets-hairdresser. Para minha alegria, os secadores calam-se, e o cabelo não sofreu danos de maior)."
Ando a levar com estes quadros desde que nasci, a cada lugar que vou.
E de cada vez que volto, deparo-me com mais cenas do género. Aqui há bem pouco tempo, no supermercado, a funcionária "começa-me" a enviar "recados" para o pequeno Sandro (pronto, chamemos-lhe António, porque este é um blog despreconceituoso... aproveito para mandar um grande bem haja a todos os Sandros leitores deste blog).
Bicho-do-mato que sou, fui incapaz de dizer o que me apetecia, que era qualquer coisa como:
-"Minha senhora. Se quiser, pode parar de trabalhar para comentar com o Antoninho. Eu não me importo de abdicar de cinco minutos para a senhora destilar o rancor que sente por certos e determinados colegas. Dito isto, acho desnecessário lançar meias frases, em código "morsa" e por cima da minha cabeça, por dois motivos: 1. Toda a gente da fila percebe, e não vamos propriamente associar o nome à funcionária da caixa cinco, ou fazer queixinhas ao gerente. 2. Ao falar por cima da minha cabeça, claramente não vê que já registou os bróculos três vezes."
Apesar de nada ter dito, devo dizer que não resisti a impedir a funcionária de ver o.... ANTÓNIO, pondo a minha cabecita sempre no seguimento do olhar da primeira... até que ela me brindou com um mudo e seco "dá licença?!", e eu, impassível, apenas devolvi um uppercut em forma de "olhe que bróculos em excesso acabam por fazer mal à saúde...".
Um dia eu chego lá e digo o que penso! Ou se calhar, é capaz de não ser boa ideia!